sexta-feira, 20 de março de 2015

O primo Basílio - Eça de Queiroz




“Tinha suspirado, tinha beijado o papel devotamente, era a primeira vez que lhe escrevia aquelas sentimentalidades e o seu orgulho dilatava-se ao calor amoroso que saía delas como um corpo ressequido que se estira num banho tépido; sentia um acréscimo de estima por si mesma e parecia-lhe que entrava enfim numa existência superiormente interessante, onde cada hora tinha um encanto diferente, cada passo conduzia a um êxtase e a alma se cobria de um luxo radioso de sensações”.

Impossível não associar este trecho com a melodia de Amor I Love You, até quando leio este trecho de Primo Basílio escuto a voz rouca de Arnaldo Antunes suspirando as palavras que casaram perfeitamente com o som da música. Mas, a obra de Eça de Queiroz é muito mais do que um trecho musical. Gosto de Eça desde a minha adolescência quando conheci sua primeira história: Os Maias, à época, em tom de brincadeira, dizia que meu filho iria se chamar Carlos Eduardo, se possível da Maia, pois achava um nome lindo.
O tempo passou, eu cresci, mas, nunca perdi a admiração pelas obras do português. Aliás, no final do livro nos é apresentado uma carta do autor para um amigo dissecando a cerca do romance, o mesmo tenta explicar o porquê de sua mais recente obra ser tão distante das obras escritas anteriormente, e Eça explica que O primo Basílio nada mais é que o retrato da hipocrisia portuguesa. A hipocrisia, que muitas vezes tem raízes na inveja alheia, impera através de fofocas e maledicências, no caso de nossa história, a hipocrisia tem sua vítima maior na figura de Luíza, a protagonista que será arrastada para uma tragédia simplesmente por ter amado. Mesmo sendo um romance de 1878, o enredo é muito atual.
 Se é impossível não associar o trecho do bilhetinho de Basílio à música de Marisa Monte, também não é possível não associar a hipocrisia da sociedade portuguesa com a hipocrisia da sociedade brasileira dos dias atuais, a qual condena um beijo homossexual na novela das 8 mas, acha perfeitamente normal ver sua filha pequena rebolando ao som de Anitta, o que mostra que as raízes de um povo tem mais influência do que poderia supor nossa vã filosofia. E viva nossa herança portuguesa, na alegria de ter os mais belos trechos da história da literatura e na tristeza das chagas herdadas!

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